“Antigamente é que era bom”
- Ana Branco

- 8 de mar. de 2024
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Durante o Estado Novo, a premissa salazarista de que homens e mulheres eram iguais “salvo quanto às diferenças decorrentes da sua natureza” justificou todo o tipo de desigualdades sociais, políticas, económicas e jurídicas. Ao género feminino era reservado um estatuto menorizado, que o conservadorismo do regime favoreceu. No início dos anos 70, a percentagem de mulheres analfabetas era muito superior à dos homens: uma em cada três não sabia ler nem escrever.
Esperava-se das mulheres que fossem recatadas, e que se mantivessem virgens até ao casamento. A pílula contraceptiva era apenas autorizada para regular os ciclos menstruais, o que levava as mulheres, sobretudo as de mais baixa condição socioeconómica, sem recursos para contornar tal proibição, a terem um elevado número de filhos. O recurso ao aborto clandestino era frequente, tendo muitas vezes consequências trágicas.
A impossibilidade do divórcio para os casais casados pela Igreja também contribuiu para um agravamento da condição feminina. No caso de separação, os filhos de uma relação posterior eram sempre considerados ilegítimos, o que, numa sociedade patriarcal, tinha consequências muito mais gravosas para as mulheres.
O chamado “regresso ao lar”, tão caro à ideologia da ditadura, marginalizava as mulheres também no mercado de trabalho. Segundo o Censo de 1970, enquanto a taxa de actividade dos homens chegava aos 89 por cento, a das mulheres era de pouco mais de 25 por cento. Mesmo assim, as desigualdades entre géneros estendiam-se a essa dimensão da vida. As mulheres operárias e camponesas concentravam em si a educação dos filhos, as tarefas domésticas e os trabalhos na fábrica ou no campo. Face aos baixos salários auferidos pelos maridos, os rendimentos das mulheres eram fundamentais para a subsistência do agregado familiar. A emigração dos homens e a guerra colonial tornavam ainda mais relevante e necessário o trabalho feminino. Apesar deste contexto, o marido podia opor-se à celebração de um contrato de trabalho com a sua mulher, bastando para isso alegar “razões ponderosas”.



















